"O blockchain é a melhor tecnologia antiburocracia que já inventamos", diz Ronaldo Lemos



 

O que é o blockchain? Para Ronaldo Lemos, advogado especialista em tecnologia, mídia e propriedade intelectual, é “a melhor tecnologia antiburocracia que já inventamos". Nada mal, certo? “É um banco de dados imutável para registrar informações, entre elas as moedas”, diz, lembrando que a tecnologia foi criada originalmente como meio de troca.

Lemos debateu com Guilherme Horn, diretor executivo de inovação da Accenture para a América Latina, sobre blockchain, uma das tecnologias mais revolucionárias da atualidade. 

Para Guilherme Horn, "Satoshi Nakamoto" – pseudônomo do anônimo criador da bitcoin, “não tinha ideia do que estava criando” quando publicou um paper descrevendo a tecnologia por trás da moeda virtual. Horn destaca que apesar de o blockchain ter sido inventado com foco no mercado financeiro, a tecnologia tem aplicações em muitos outros setores, como saúde, agronegócio, comércio internacional e varejo.

“Hoje, há 85 provas conceito sendo rodadas em blockchain no mundo, e apenas 30% delas são aplicações para o mercado financeiro”, diz o diretor-executivo da Accenture. Essa tecnologia, afirma, tem aplicações em todos os setores em que há longas cadeias de fornecimento e falta de confiança entre as partes. É possível, por exemplo, rastrear uma semente usada em um alimento. “As múltiplas partes daquela cadeia inserem os dados, e é a própria rede que valida as informações”.

Ronaldo Lemos lembrou da Operação Carne Fraca, que teve início em março de 2017 e envolveu frigoríficos e fiscais do Ministério da Agricultura e Pecuária. “Com o blockchain, conseguiríamos saber onde cada animal foi abatido, por qual frigorifico, qual caminhão transportou, onde fiscal deu selo de inspeção e qual foi o fiscal. Poderíamos colocar um código QR na embalagem, e o consumidor, no supermercado, poderia checar a cadeia inteira”, diz Lemos. Essa certificação, afirma o advogado, seria fundamental para o agronegócio brasileiro, que hoje enfrenta a concorrência de países como Austrália e Nova Zelândia, empenhados em desenvolver tecnologia para assegurar a origem dos animais.

Para Horn, um dos desafios à implementação do blockchain não é apenas o investimento, mas uma mudança na cultura. “Precisamos investir nas pessoas, a gente não foi treinado para confiar nos dados”, afirma.

A primeira vez em que Lemos ouviu falar em blockchain foi em 2011, quando era professor visitante na Universidade Princeton. “Na época, um bitcoin custava US$ 3, e eu não comprei porque achei muito caro”, afirma, lembrando que a cotação alcançou US$ 18 mil no ano passado. No entanto, ele diz acreditar que a melhor aplicação do blockchain não é no mercado financeiro: é na governança e em serviços públicos.

“Todo governo vai se transformar em plataforma digital. Governo que não se digitalizar, não será mais governo”, diz. “O potencial de transformação para o Estado é muito importante”. Segundo Ronaldo Lemos, Índia, Estônia e Canadá lideram a criação de mecanismos digitais.

No Brasil, contudo, os desafios para essa digitalização são grandes. O advogado diz estar trabalhando atualmente no mapeamento de silos de informação do governo, como Caixa e DataPrev. “Um banco de dados não conversa com o outro, uma informação não é compatível com a outra”, comenta.

Guilherme Horn afirma que outro desafio é a falta de conhecimento sobre a tecnologia. “O paper que criou o bitcoin tem oito páginas e é super anárquico, fala sobre uma moeda que não tem nem validação de um banco central e nem de um governo. Mas não precisa ser nada disso, é possível implementar essa tecnologia dentro do governo, o governo passa a ser viabilizador”. Horn diz estar otimista quanto aos avanços no Brasil. Ele lembra que o Banco Central já realizou dez testes envolvendo blockchain.

Fake news

Ronaldo Lemos afirmou que o blockchain é visto também como uma das possíveis soluções contra fake news – notícias falsas espalhadas nas redes sociais, que frequentemente envolvem alteração de imagens. “Toda foto pode ter sua autenticidade certificada por blockchain. Seria como um carimbo de realidade, dizendo que a imagem foi captada direto da realidade, sem alteração”, explica.


Fonte: Época Negócios