Corretora de Bitcoin Bitfinex usou empréstimo de Tether para cobrir rombo de US$ 850 milhões



Corretora de Bitcoin Bitfinex usou empréstimo de Tether para cobrir rombo de US$ 850 milhões

 

A procuradoria-geral de Nova York revelou que está investigando a plataforma de compra e venda de criptomoedas Bitfinex e outras empresas do mesmo grupo, incluindo a Tether. Segundo as autoridades, foram encontrados indícios de atividades irregulares ou de falhas na comunicação com investidores após US$ 850 milhões (cerca de R$ 3,3 bilhões) de recursos da empresa e de clientes "sumirem" de uma prestadora de serviços de pagamentos da Bitfinex e uma linha de crédito ser aberta de forma suspeita junto à Tether.

As investigações começaram em 2018. Desde novembro, advogados que representam a Bitfinex nos Estados Unidos estão cooperando com a procuradoria e entregando documentos solicitados extrajudicialmente. Contudo, a procuradoria avaliou que a empresa estaria atrasando o fornecimento da documentação para prosseguir com atividades de crédito: ou seja, a entrega dos papeis ocorria apenas após a transação já ter sido realizada, impedindo as autoridades de solicitar o bloqueio da movimentação ou de solicitar mais detalhes previamente.

A procuradoria também acredita que a Bitfinex ainda tenha clientes no estado de Nova York, embora a companhia não detenha os alvarás e licenças necessários para operar e ter clientes nos Estados Unidos. Essas suspeitas permitem que a Procuradoria leve a investigação à Justiça do Estado de Nova York.

A Bitfinex informou em seu site que as alegações da procuradoria são falsas, que a empresa está "financeiramente forte" e que as autoridades deveriam estar ajudando a reaver o dinheiro, que não está "perdido" e sim "salvaguardado" após uma apreensão.

A companhia não explicou por que não comunicou essas operações a seus clientes.

No centro da contestação está a Tether, uma empresa do grupo da Bitfinex que mantém uma "moeda estável" (stablecoin) chamada Tether, ou USDT. Essa criptomoeda é comercializada em diversas plataformas e sustentada pela promessa de que a empresa tem dinheiro em caixa para garantir que 1 USDT valha exatamente US$ 1.

Dessa maneira, a Tether torna-se um meio de realizar transações em dólar nos mesmos ambientes de operação de criptomoedas, sem regulamentação.

Plataformas de compra e venda que não cumprem a legislação bancária para trabalhar diretamente com dólares também fazem uso do USDT. Uma estimativa da Crypto Compare aponta que 80% de todas as transações de Bitcoin ocorrem com USDT. De acordo com o site Coin Market Cap, o volume diário do Tether é o único que rivaliza com o do próprio Bitcoin: nas últimas 24 horas, o volume do Bitcoin atingiu US$ 17,9 bilhões, contra US$ 16,5 bilhões do Tether e US$ 8,1 bilhões da Ethereum, a terceira colocada.

Em março, o site da Tether, que sempre afirmou que cada USDT era vinculado a um dólar em moeda, foi modificado. O site agora diz que os USDTs podem ser assegurados por "dinheiro ou bens equivalentes a dinheiro".

O Tether nunca foi auditado e, portanto, não há garantia de que os valores sejam mesmo assegurados. A empresa chegou a contratar uma empresa de auditoria, mas o serviço foi cancelado sem nenhum resultado ser divulgado.

Nesta sexta-feira (26), o Bitcoin operava em queda de 3,5% a US$ 5.290 e Tether operava a US$ 0,99, em queda de 1,4% e abaixo do seu valor assegurado.

Dinheiro 'sumiu' em processadora de pagamentos
Por conta do seu ramo de atuação, a Bitfinex encontra dificuldades em encontrar um banco que aceite prestar serviços à plataforma. A procuradoria observa que a companhia operou junto a diversos bancos, como Wells Fargo, Nobel, Deltec, Signature Bank e Metropolitan Commercial Bank.

Em algum momento a Bitfinex contratou os serviços da Crypto Capital Corp (CCC), que deveria honrar saques e depósitos feitos por clientes. Em meados de 2018, a Bitfinex começou a ter dificuldades para honrar saques e, segundo conversas entre a Bitfinex e a CCC reveladas pela procuradoria, o motivo era um rombo de US$ 851 milhões em recursos devidos pela CCC à Bitfinex que nunca foram recuperados.


"O Bitcoin pode ficar abaixo de US$ 1 mil se não fizermos nada", disse um executivo da Bitfinex à CCC, em referência à necessidade de honrar os compromissos financeiros da plataforma com seus usuários. A conversa ocorreu em outubro de 2018.

Em novembro, a Tether transferiu US$ 625 milhões para a Bitfinex para "resolver questões de liquidez não relacionadas ao Tether", segundo a Procuradoria de Nova York. Em seguida, foi aberta uma "linha de crédito" permanente entre a Bitfinex e a Tether, avaliada em US$ 700 milhões.

O sumiço dos recursos vinculados à Crypto Capital e a linha de crédito aberta pela Bitfinex junto à Tether para honrar seus compromissos não foram informados a investidores. Ainda segundo a Procuradoria, a Bitfinex suspeita que os diretores da CCC poderiam estar envolvidos em fraudes. A Bitfinex não comentou sua relação com a processadora de pagamentos.

Crypto Capital
Recursos da Crypto Capital podem ter sido apreendidos por autoridades dos Estados Unidos, de Portugal e da Espanha, o que explicaria em parte por que a empresa não devolveu o dinheiro da Bitfinex.

Na Polônia, a imprensa divulgou em abril de 2018 que cerca de US$ 370 milhões foram bloqueados de um banco polonês após uma investigação de lavagem de dinheiro do narcotráfico. Uma das contas bancária envolvida nessa situação estaria envolvida com a Crypto Capital e, portanto, com a Bitfinex. Essa informação nunca foi diretamente confirmada.

Porém, a Bitfinex não era a única cliente da Crypto Capital. A processadora de pagamentos também prestava serviços para a QuadrigaCX, uma plataforma de compra e venda canadense que está em liquidação judicial após a morte do dono e a impossibilidade de recuperar valores a receber.

A QuadrigaCX também não conseguia abrir contas bancárias no Canadá para operar e recorreu a parceiros para processar os pagamentos. Um desses parceiros foi a Crypto Capital.


Em seu site, a Crypto Capital informa operar em horário europeu, da Suíça. Embora esteja falida, a QuadrigaCX ainda é a primeira que aparece em sua lista de clientes. Segundo a procuradoria do estado de Nova York, acredita-se que a empresa na verdade seja registrada no Panamá.

Segundo a imprensa polonesa, as contas bloqueadas na Polônia pertenciam a um panamense e a um colombiano.


Fonte: G1